Teatro

Discussões sobre autoritarismo permeiam espetáculo Jogos na Hora da Sesta

O Teatro da Vértebra apresenta peça de teatro escrita pela dramaturga romena Roma Mahieu

Peça de autora romena radicada na Argentina começa temporada no Teatro de Arena dia 3 de novembro – aos domingos, elenco e especialista em alguma área do conhecimento debatem espetáculo com o público

O Teatro da Vértebra apresenta a partir do dia 3 de novembro, sábado, às 20h30, no Teatro de Arena, temporada de Jogos na Hora da Sesta, peça de teatro escrita pela dramaturga romena radicada na Argentina Roma Mahieu em 1976. O espetáculo retrata situações de violência e autoritarismo praticadas por crianças. A partir de brincadeiras e objetos muito associados à infância, hierarquias e traços de opressão se estabelecem. Por escolha da autora, todas as personagens são interpretadas por atores e atrizes adultos. O espetáculo foi escrito em meio à ditadura militar argentina e foi censurado pelo governo, fazendo com que Roma se exilasse em Madri, Espanha, a partir de 1978.

Jogos na Hora da Sesta – Foto Allan Bravos

Para Sérgio Marques, diretor da montagem, o êxito da peça está em retratar a postura ditatorial sem ser panfletária ou maniqueísta. “O texto parte de um lugar cotidiano para chegar nas situações extremas, o que faz com que o público identifique na própria vivência os perigos de certos comportamentos e para onde eles podem ser levados”, diz. Essa observação ganhou força a partir de uma experiência proposta pelo grupo desde a primeira temporada do espetáculo: a cada domingo acontece um debate entre público, atores e algum especialista convidado pela equipe (professor, sociólogo, artista etc).

“Nesses diálogos percebemos abertura para falas de pessoas com espectros ideológicos muito diferentes”, diz Sérgio. Entre outros assuntos, a peça passa por questões como a opressão, o silenciamento de certas camadas da sociedade e a violência. “Também achamos importante preservar a memória das marcas profundas deixadas por regimes ditatoriais”, ressalta o diretor.

Jogos na Hora da Sesta – Foto Allan Bravos

Para dar caráter atemporal à peça, Sérgio opta por figurinos neutros que não remetam a uma época em específico. Ainda que criado durante a ditadura argentina, as ações praticadas pelas personagens podem estar situadas em qualquer lugar e em qualquer período. O diretor também optou que as personagens não expressassem infantilidade na inflexão de voz, mas que os traços da infância fossem relevados pelas ações cênicas e pelo sentido do que estão dizendo. “É uma escolha que traz mais dificuldade para o elenco, mas que também reforça metáforas importantes com o público sobre os comportamentos abusivos que acontecem em cena”, justifica.

Como trilha sonora, a cantiga Se Essa Rua Fosse Minha é executada ao vivo com variações e desconstruções melódicas ao longo do espetáculo, ocupando o lugar de pausas e suspensões. O elenco do espetáculo conta com a participação de Diego Pallardó, ator argentino de 52 anos que viveu a ditadura argentina durante a infância. “Eu era uma dessas crianças brincando no parquinho e me lembro que a violência praticada por nós, na rua, era um reflexo do que estávamos vivendo, um autoritarismo absorvido pelos adultos”, diz o ator.

Para Diego, a montagem brasileira tem muita relevância por traçar semelhanças políticas entre os dois países. “A Argentina e o Brasil são novos, democraticamente falando. O regime democrático se instaurou há pouco tempo nos dois países e o povo ainda está tentando entender como ele funciona”, diz Diego. Sobre o momento atual do país, o ator aprova a força com que a discussão política se inseriu na sociedade, principalmente entre a juventude. “Na Argentina, percebo que esse lugar da discussão política intensa acontece há mais tempo do que aqui, como tem acontecido agora”, opina.

Diego, que também é escultor, mora no Brasil desde 2008. Na Argentina, teve aulas de atuação com o ator Julio Chávez. Por aqui, integrou o elenco de diversas peças pela Indac Escola de Atores, por onde é formado, e fundou a Companhia Argento-Brasileira de teatro, que reúne representantes dos dois países e tem a primeira montagem prevista para o próximo ano.

Jogos na Hora da Sesta pelos atores

“Até a última temporada, apresentamos Jogos com a responsabilidade da memória: recordar para que não se repita. Hoje, infelizmente, o horror todo da peça está muito próximo. Ameaças violentas contra a liberdade de expressão e contra a liberdade de ser já estão acontecendo com a iminência de um governo que promete uma faxina da população.” – Beatriz Porto

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“A própria Roma Mahieu falou que a peça trata de violência em seus extremos. E na minha opinião não necessariamente a violência obvia, mas até mesmo uma violência mais sutil, que fere as nossas necessidades mais básicas como elementos de uma sociedade. A violência que nos tolhe nossas liberdades mais essenciais.” – Mateus Torres

“Essa peça não é sobre regimes militares, mas sim sobre regimes autoritários. Sobre toda sociedade que manifesta algum tipo de discriminação. Nesse sentido, ela é uma possibilidade de o espectador refletir sobre seu próprio lugar e sobre posturas autoritárias que às vezes assume. Sendo assim, fica uma reflexão sobre o quão responsável cada um é por gerar esse tipo de situação no cotidiano.” – Diego Pallardó

Sobre Roma Mahieu

A autora nasceu em 1937 na Polônia, mas foi morar em Santa Fé, Argentina, aos 10 anos de idade. Tem mais de 20 peças, contando com prêmios em diversos países como Brasil, Argentina, Itália e Espanha. A própria peça Jogos na hora da sesta recebeu os prêmios Talia, Argentores e Molière na Argentina. Em sua trajetória, Roma se dedicou também ao jornalismo, à fotografia e ao ensino.

Sinopse curta

Um grupo de crianças brinca no parquinho da rua. Os jogos que se desenrolam ao longo do dia abrem brechas para que a personalidade de cada uma seja friamente revelada. Assim, as brincadeiras incitam jogos de poder, violência e crueldade.

Jogos na hora da sesta, espetáculo de autoria da argentina Roma Mahieu, é um retrato cru e cruel das duas faces da hostilização: a de quem violenta e a de quem é violentado. A peça, lançada em 1976, fala do que muitos preferiram calar quando a dramaturga, observando as relações que se estabeleciam durante a ditadura militar argentina, decidiu registrar o perverso.

Sobre o Teatro da Vértebra

O Teatro da Vértebra (antigo Grupo Mamemi) foi fundado no início de 2016 a partir da vontade de atores e músicos de expressarem e trabalharem algumas das suas inquietações em cena. A partir da pesquisa e alinhamento dessas questões, foi escolhido o texto Jogos na Hora da Sesta, de Roma Mahieu,. O grupo fez temporadas da peça no Espaço Cultural Santa Cecília (2016), na Inbox Cultural (2017), e na Vila Maria Zélia (2018). No segundo semestre de 2017, compuseram a programação da 18ª Satyrianas, festival de teatro típico de São Paulo, apresentando na Estação Satyros, e em 2018 compôs a programação da Virada Cultural em São Paulo. Em 2018 o Grupo tem temporada agendada para o mês de novembro no Teatro de Arena Eugênio Kusnet, em parceria com a Funarte, e está trabalhando em uma nova encenação a partir da obra O Verdugo, de Hilda Hilst.

As escolhas de repertório do Teatro da Vértebra tangem questões de apagamento histórico de causas sociais e discussões sobre o poder. Até agora, as duas peças do grupo – Jogos na Hora da Sesta e O Verdugo (em montagem), de Hilda Hilst, coincidem por serem peças escritas por mulheres latino-americanas durante regimes ditatoriais. Após a montagem de O Verdugo, os integrantes planejam encenar uma peça autoral.

Ficha Técnica

Texto: Roma Mahieu. Direção: Sérgio Marques. Elenco: Alessandra Vitanis, Bárbara Ablas, Beatriz Belintani, Beatriz Porto, Dante Passarelli, Diego Pallardó, Lia Pires, Lucas Leite, Mateus Torres e Victor Rosa. Trilha Sonora original: Piero Schlochauer. Violoncelo: Vinicios Borges Piano: Rafael Salgado. Cenografia: Diego Pallardó Desenho de luz: Henrique de Paula. Produção: Isadora Borian.

Serviço

Espetáculo de teatro Jogos na Hora da Sesta

De 3 de novembro a 2 de dezembro. Sexta e sábado, 20h30, e domingo, 18h. Aos domingos, haverá debate após as apresentações.

Obs: Não haverá sessão nos dias 16, 17 e 18 de novembro.

Teatro de Arena Eugênio Kusnet. Endereço: Rua Dr. Teodoro Baima, 98 – República, São Paulo.

Ingressos: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia).

Classificação indicativa: 14 anos

Duração: 60 min

Fonte: Ensaio Comunicação

 

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Lourdes Castro

Nascida em São Paulo, Capital - SP, Brasil, Formada em Comunicação Social pelas Fiam- Faculdades Integradas Alcântara Machado, Pós Graduada em Administração de Marketing pela Fecap, Especialização em Assessoria de Imprensa pelo Senac. Jornalista, Assessora de Imprensa e Produtora do Programa Fama & Destaque da Apresentadora Viviane Alves, pela TV Guarulhos. MTB 15521

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