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Como o ator deve treinar e adaptar o sotaque de um personagem

Elenco Segundo Sol - Foto Divulgação

A dificuldade de encontrar o sotaque no personagem

A fonoaudióloga especialista em sotaque Roberta Bahia tira todas as dúvidas e dá dicas incríveis

O sotaque baiano dos personagens de Segundo Sol chama a atenção. Cada personagem fala de um jeito – alguns falam lentamente como se estivesse sempre deitado numa rede.

Este é o caso de Beto Falcão (Emilio Dantas), mas ator carioca tem conseguido convencer que é um baiano da boa terra.

Por outro lado, temos o exemplo de Manuela (Luísa Arraes), apesar de ser uma atriz talentosa, tem sofrido para reproduzir o sotaque local.

Especialmente em cenas em que Manuela está sob efeitos das drogas. Aí ela esquece completamente da pronúncia baiana e emplaca aquele carioquês.

Essa situação remete a outros trabalhos da TV Globo que não convenceram no sotaque como Sonho Meu e a Indomada.

Porém, vemos uma clara diferença quando os sotaques são de novelas nordestinas. Os atores conseguem assimilar mais esse tipo de sotaque como na novela Velho Chico.

E embora muitas vezes o sotaque seja carregado demais, eles convencem mais.

Para explicar mais sobre isso, falamos com a fonoaudióloga especialista em sotaque Roberta Bahia, do Estúdio da Voz para explicar mais essas variações de sotaques.

1) Qual a dificuldade que um ator tem para se adaptar a um outro sotaque? Qual seria o tempo ideal de preparação?

Acredito que a primeira dificuldade é se caso o ator já tenha algum sotaque muito marcado, ele terá primeiro que suavizar para depois treinar o sotaque da personagem.

O segundo passo seria a identificação dos sons mais característicos do sotaque que ele deseja adquirir.

A princípio pode parecer simples, pois muito indivíduo, de modo geral, ao longo da vida convive ou já conviveu, e/ou assistiu e ouviu na televisão, rádio e internet, pessoas de todas as regiões do Brasil e do mundo.

E quem nunca brincou de imitar o sotaque de outra região? Porém, quando se trata de construção de personagem é muito importante estudar as características predominantes e as particularidades de cada região.

Lembrando que uma mesma região pode apresentar características bem diferentes.

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E aí, a dificuldade maior é trabalhar para adquirir veracidade e não ficar somente no estereótipo daquele sotaque.

No teatro essa dificuldade é mais branda, pois o jogo teatral permite mais liberdade, já no audiovisual essa questão tem sido muito levantada, uma vez que o telespectador está esperando identificar o personagem como natural de tal região e quando isso não acontece começa toda uma polêmica.

“Tantos atores naturais de tal lugar, porque não os chamam ao invés de colocar sotaque nos atores cariocas?”.

Ouve-se muito isso tanto do público como de muitos atores que acabam perdendo oportunidade de trabalho.Mas acredito que esse cenário esteja mudando.

Quanto ao tempo ideal para adquirir o sotaque, depende muito de como será o preparo.

Se o trabalho é realizado individualmente tem um rendimento melhor do que realizado em grupo.

Varia também dependendo da facilidade do indivíduo, sua percepção auditiva e como falei no início se o ator já tem ou não sotaque marcado.

Atualmente realizo treinamentos que podem durar de 4 a 6 encontros de 1 à 3 horas de duração, dependendo da quantidade de alunos. Nesse tempo é possível passar técnicas para o ator treinar.

Muitos já adquirem o novo padrão de fala nesse tempo, mas quanto mais se prática mais natural pode ficar. Vale ressaltar que também depende da exigência da direção e liberdade de criação.

2) Existe um sotaque mais “fácil” de aprender? Pois, percebemos que o sotaque nordestino é mais fácil para os atores. Porque?

Não considero que exista sotaque mais fácil ou mais difícil, na verdade é algo que depende muito da pessoa que está aprendendo.

Depende muito da percepção auditiva e o quão se treina, seja para se apropriar o novo padrão de fala quanto para suavizar o sotaque original.

Quanto ao sotaque nordestino, não diria ser o mais fácil, mas sim que é o mais praticado, até pela nossa história cultural e se ter muitas obras e artistas que ganharam destaque oriundos dessa região.

O que faz com que se propague com mais facilidade o modo de falar do Nordeste, mas vale ressaltar que o Nordeste é uma região muita extensa e há particularidades dependendo do Estado que se quer adquirir o sotaque.

3). Tem pessoas que não querem ter sotaque, especialmente alguns atores para trabalhar em novelas.

 Em quanto tempo uma pessoa pode perder o sotaque?

Essa é uma demanda maior para trabalhos de audiovisual (pela exigência de veracidade) principalmente na TV.

Os programas em geral são transmitidos em rede nacional, e se acredita essa neutralidade de regionalismo seja importante para melhor comunicação em massa, pois muitas vezes o personagem é de outra região que não a de origem do ator.

E é importante que seja dada mais atenção a história da personagem, daí o sotaque pode se tornar uma barreira.

Mas gosto de deixar bem claro para os meus clientes que o treino para suavizar ou neutralizar é mais uma ferramenta que o ator adquire para aumentar suas possibilidades de atuação, assim como as demais técnicas para o aperfeiçoamento da expressividade vocal.

Não necessariamente ator precisa perder o sotaque no dia a dia.

Muitos produtores em cursos de treinamento para TV e cinema frisam muito a importância de “perder” o sotaque.

E da forma como é colado gera uma cobrança por parte do ator e até mesmo pode causar frustrações, tornando o treino mais difícil. O tempo como já citei noutra resposta está ligado a muitos fatores.

Dentre eles, que eu não citei ainda, está relacionado com a motivação que leva o ator a buscar esse treinamento.

Gosto muito de saber qual o desejo deles para tornar o processo leve e divertido e não só um “tenho que…”.

Percebemos que não é fácil incluir e nem tirar um sotaque com perfeição, mas com uma boa profissional e força de vontade tudo é possível.

Você sabia que existem exercícios no dia a dia que ajudam a amenizar o sotaque? Roberta Bahia explica exercícios que podem ser feitos em casa.

Muitos dos exercícios que utilizo, aprendi em alguns treinamentos que realizei para suavizar o meu sotaque com a Fonoaudióloga Leila Mendes e estudos com minha sócia Jane Celeste.

Além disso os conhecimentos de linguísticas que adquirir com Núbia Pimentel especialista em Língua Portuguesa.

São muitos exercícios e, embora simples de praticar, são complicados de passar assim. Mas adianto algumas dicas que podem ajudar a iniciar o treino no dia a dia.

Primeira dica que posso dar e uso como avaliação no início do trabalho é se gravar em uma conversa espontânea (hoje com recurso do WhatsApp, já usamos muito conversas em áudios).

Depois gravar um monólogo e ouvir, observando quais são as características da fala que a diferencia dos demais sotaques.

Depois de adquirir consciência é hora de identificar o que seria então neutralizar essas características, para isso se realiza um treino específico para cada caso e exercícios gerais, que serve para todos os tipos de sotaque.

Como é o trabalho que se realiza com as sílabas tônicas (algumas regiões dão mais ênfases nas sílabas pré tônicas.

No caso do Baiano, há uma tendência a colocar mais força e abrir as vogais no início das palavras).

Esse processo inicial é pura percepção e escuta. Ouvir noticiários nacionais, seja na TV ou rádio é ótimo exercício para identificar como é o padrão neutro. Observar e tentar reproduzir as palavras.

Deve se dar atenção a duração das vogais e consoantes. Existem também exercícios musculares que realizo para que haja uma automatização mais fácil desse novo padrão. Vale a pena conhecer.

Percebemos que não é fácil incluir e nem tirar um sotaque com perfeição, mas com uma boa profissional e força de vontade tudo é possível.

Você sabia que existem exercícios no dia a dia que ajudam a amenizar o sotaque?

Roberta Bahia explica exercícios que podem ser feitos em casa.

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